A sociedade civil e as organizações indígenas rejeitam reiteradas iniciativas para enfraquecer as regulamentações ambientais e dos povos indígenas que afetariam o direito à vida, à saúde, ao território e à natureza

Oct 10, 2023 | Amazon, Áreas Naturais Protegidas, consulta prévia, direitos indígenas, Diversidade biológica, gestão ambiental, hidrocarbonetos, Infra-estruturas, Mineração, PIACI, Programa de Sustentabilidade

Organizações da sociedade civil e povos indígenas se manifestam contra a série de propostas do Executivo, Congresso e outros atores do setor privado, que sob o discurso de promover investimentos e acabar com a “papelada ambiental” buscam desmontar os direitos dos povos indígenas, seu território, afetando sua vida e integridade; bem como as instituições ambientais e o descaso com a proteção do nosso patrimônio natural, da vida e da saúde das pessoas e do nosso direito constitucional a um meio ambiente saudável e adequado.

Manifestamos nossa preocupação com a aprovação da lei que cria a Autoridade Nacional de Infraestrutura (ANIN), Lei nº 31841, e sua posterior proposta de regulamentação, que deverá ser publicada nos próximos dias. Nossa principal preocupação com essa regulamentação reside na redução do prazo de 120 para 90 dias para o processo de avaliação ambiental de projetos de investimento, o que implica a criação de um procedimento excepcional de certificação ambiental sem conhecer os detalhes de suas fases e prazos. Essa mudança não tem embasamento técnico, mas teria apenas a necessidade de acelerar a certificação ambiental, sem considerar a necessidade urgente de melhorar a qualidade dos estudos de impacto ambiental e a sustentabilidade socioambiental dos investimentos. Da mesma forma, isso poderia afetar os processos de participação cidadã, uma vez que, ao encurtar os prazos, esses processos são impactados e violariam o direito à participação, à consulta e ao consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas, reconhecido em instrumentos e normas internacionais obrigatórios para o Estado peruano, o que poderia trazer consigo responsabilidade internacional e conflitos sociais. entre outras violações.

Ressalte-se que este não é um processo isolado, mas se soma ao Decreto Legislativo nº 1553, que permite a elaboração de estudos de impacto ambiental com engenharia básica, bem como a promoção de frações de certificação ambiental. Ressaltamos, ainda, que deve ser mantido o silêncio administrativo negativo (reprovação das alegações na ausência de pronunciamento da autoridade administrativa, no prazo estabelecido para esse fim) nos procedimentos de avaliação dos instrumentos de gestão ambiental, de acordo com o disposto no artigo 38 do Texto Único Harmonizado da Lei Geral do Processo Administrativo. que estabelece silêncio negativo para procedimentos que possam afetar significativamente o interesse público, para questões como saúde, meio ambiente, recursos naturais, entre outros.

Além disso, a Sociedade Nacional de Mineração, Petróleo e Energia propôs uma iniciativa para fundir o Serviço Nacional de Certificação Ambiental para Investimentos Sustentáveis (SENACE) com autoridades do setor ambiental, como a Autoridade Nacional de Águas (ANA) e o Serviço Nacional de Florestas e Vida Silvestre (SERFOR), o que foi duramente rejeitado pela sociedade civil. Na mesma linha, podemos contar também a iniciativa da Perupetro de abrir Áreas Naturais Protegidas para uso indireto para exploração e aproveitamento de hidrocarbonetos, proposta que também foi rejeitada pelo setor ambientalista. No entanto, continuaria a ser promovida pelos congressistas, que vêm gerando espaços de debate para tentar enfraquecer o atual arcabouço legal, o retrocesso de direitos e o mandamento constitucional de proteção às Áreas Naturais Protegidas.

Na mesma linha, não surpreende que, no dia 27 de setembro, a Resolução Ministerial nº 297-2023-MINAM tenha pré-publicado o projeto ”Decreto Supremo que Estabelece Disposições para Otimizar o Processo de Avaliação de Impacto Ambiental”, proposta que formaria uma equipe técnica formada pelas diversas autoridades parecerantes que ficarão a cargo do SENACE, inclusive em instalações próprias para avaliar o estudo ambiental e elaborar um relatório que integrasse o opiniões diversas. Isso seria prejudicial na prática, pois as autoridades poderiam perder independência e autonomia, o que geraria estudos ambientais de menor qualidade, que não protegem adequadamente os direitos dos povos indígenas, o direito à saúde, ao meio ambiente, entre outros direitos, dos graves impactos negativos gerados pela imposição de atividades extrativistas e de infraestrutura.

Também manifestamos nossa preocupação com a pré-publicação de outro Decreto Supremo que estabelece a criação da Reserva Nacional do Mar Tropical de Grau, por meio da Resolução Ministerial nº 295-2023. Esta pode ser uma excelente notícia; no entanto, é ofuscado pelo facto de, na sua exposição de motivos, a pesca industrial ser permitida no sector do Banco de Máncora. As consequências podem ser desastrosas para a biodiversidade do ecossistema marinho, para a pesca artesanal e para toda a população, especialmente para quem vive no entorno. E eles novamente vão contra o mandato constitucional de proteger os NPAs e são ainda mais discordantes com as categorias de NPAs existentes em nosso país.

Por fim, há grande preocupação com a recente tentativa do Congresso da República de reabrir, pela quinta vez, o Cadastro Integral de Formalização da Mineração – REINFO, por meio dos Projetos de Lei nºs 2172, 2519, 3621 e 5171, que propõe estabelecer novas condições de acesso à REINFO e um novo período de registro, o que facilitaria o garimpo ilegal. Isso agravaria, por exemplo, os impactos sociais, espirituais, culturais e ambientais com a consequente destruição dos territórios dos povos indígenas, bem como o impacto em sua vida, integridade e saúde.

Como é evidente, estamos atualmente num contexto em que são promovidos novos investimentos através da ANIN, 31 áreas de hidrocarbonetos são promovidas a nível nacional e os processos são procurados para serem acelerados independentemente da qualidade da avaliação de impacto ambiental ou da consulta e consentimento prévios, livres e informados dos povos indígenas. Por isso, é necessário dispor de normas e instrumentos técnicos que garantam que sejam respeitados os direitos à saúde, ao meio ambiente saudável e à vida de todos, bem como os direitos à participação cidadã e à consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas.

Diante disso, instamos as autoridades a se comprometerem a:

  1. Respeitar os direitos dos povos indígenas com a participação, consulta e consentimento dos povos indígenas e suas organizações representativas.
  2. Fortalecer as instituições ambientais e dispensar a aprovação desse tipo de instrumentos regulatórios que violam direitos e fragilizam a capacidade de gestão e tomada de decisão nos procedimentos administrativos em matéria ambiental.
  3. Respeitar e fortalecer a autonomia e independência das entidades do setor ambiental.
  4. Posicionar-se contra a redução dos prazos dos processos de avaliação de impacto ambiental, fato que dificulta sua otimização e melhoria de qualidade, bem como respeitar e promover a participação e consulta cidadã e o consentimento livre, prévio e informado.
  5. Adotar as recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE para continuar o processo de fortalecimento e implementação do Serviço Nacional de Certificação Ambiental para Investimentos Sustentáveis para uma gestão ambiental eficiente e independente.
  6. Garantir a democracia do Estado de Direito, efetivando os direitos e mecanismos de participação cidadã, consulta e consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas e suas organizações representativas; respeitar os direitos dos povos indígenas, bem como fortalecer as instituições ambientais.

Da sociedade civil, pedimos ao Estado peruano e ao setor privado que respeitem nosso marco regulatório e institucional e cumpram os compromissos internacionais sobre direitos humanos, proteção dos povos indígenas e do meio ambiente, a fim de fortalecer a governança ambiental e os povos indígenas sobre seu território no Peru.

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